26 de dez. de 2020

Direito Empresarial – O conceito de Empresário

Conceito de Empresário


Tendo o Código Civil de 2002 adotado a teoria da empresa
em substituição à antiga teoria dos atos de comércio, suas regras não utilizam mais as expressões ato de comércio e comerciante, que foram substituídas pelas expressões empresa e empresário.


Do Empresário

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.


Do conceito de empresário estabelecido no art. 966 do Código Civil, podemos extrair os principais elementos indispensáveis à sua caracterização, quais sejam: 


a) profissionalmente; só será empresário aquele que exercer determinada atividade econômica de forma profissional, ou seja, que fizer do exercício daquela atividade a sua profissão habitual. Quem exerce determinada atividade econômica de forma esporádica, por exemplo, não será considerado empresário, não sendo abrangido, portanto, pelo regime jurídico empresarial. 


b) atividade econômica; empresa é uma atividade exercida com intuito lucrativo. Afinal, é característica intrínseca das relações empresariais a onerosidade. Mas não é só à ideia de lucro que a expressão atividade econômica remete. Ela indica também que o empresário, sobretudo em função do intuito lucrativo de sua atividade, é aquele que assume os seus riscos técnicos e econômicos.


c) organizada; empresário é aquele que articula os fatores de produção (capital, mão de obra, insumos e tecnologia).  O exercício de empresa pressupõe, necessariamente, a organização de pessoas e meios para o alcance da finalidade almejada.


d) produção ou circulação de bens ou de serviços: em contraposição à antiga teoria dos atos de comércio, a qual restringia o âmbito de incidência do regime jurídico comercial a determinadas atividades econômicas elencadas na lei, para a teoria da empresa, em contrapartida, qualquer atividade econômica poderá, em princípio, submeter-se ao regime jurídico empresarial, bastando que seja exercida profissionalmente, de forma organizada e com intuito lucrativo. Sendo assim, a expressão produção ou circulação de bens ou de serviços deixa claro que nenhuma atividade econômica está excluída, a priori, do âmbito de incidência do direito empresarial.



Conceito de Empresa


Da Empresa

A partir do conceito de empresário pode-se estabelecer, logicamente, que empresa é uma atividade econômica organizada com a finalidade de fazer circular ou produzir bens ou serviços.


Empresa é, portanto, uma atividade, algo abstrato. Empresário, por sua vez, é quem exerce empresa de modo profissional. Assim, deve-se atentar para o uso correto da expressão empresa, não a confundindo com a sociedade empresária (pessoa jurídica cujo objeto social é o exercício de uma empresa, isto é, de uma atividade econômica organizada). Empresa e empresário são noções, portanto, que se relacionam, mas não se confundem. A propósito, Ferrara Jr. e Corsi referem-se à noção de empresário e à de empresa como correlatas, pois enquanto empresário é quem exerce uma empresa, esta é o exercício de um atividade econômica organizada.


Também não se deve confundir, por exemplo, empresa com estabelecimento empresarial. Este é um complexo de bens que o empresário usa para exercer empresa, isto é, para exercer uma atividade econômica organizada.


Enfim, empresa é uma atividade econômica organizada, e empresário é a pessoa, física ou jurídica, que exerce uma empresa profissionalmente. Quando o empresário for pessoa física, nós o chamamos de empresário individual; quando o empresário for pessoa jurídica, estaremos diante ou de uma sociedade empresária ou de uma EIRELI (art. 980-A do CC).



Fontes: 

1. Direito empresarial: volume único / André Luiz Santa Cruz Ramos. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020.


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As notas aqui utilizadas refletem diretamente aquilo que o autor do blog destaca da obra original durante a leitura da mesma, utilizando-se geralmente de citações diretas, indiretas e paráfrases, além de comentários pertinentes que podem ser retirados de outros trabalhos. As notas são criadas com o único intuito de fornecer um rápido acesso a consultas posteriores para estudo sobre o tema. Caso o leitor do blog tenha alguma dúvida ou gostaria de complementar algo, fique à vontade para deixar um comentário logo abaixo ou entre em contato mediante o instagram @waldeirmarques, ou email

29 de nov. de 2020

Memórias do Subsolo – Fiódor Dostoiévski

Memórias do Subsolo


De acordo com a introdução de Richard Pevear, tradutor da edição publicada pela Everyman's Library, Memórias do Subsolo (1864) trata-se de um antilivro por reunir características que conflitam diretamente com a literatura popularmente empregada no pensamento russo (Pushkin, Lérmontov, Tchernichevski, Kant, Schiller, Byron, Rousseau, e, principalmente, Niztche) durante a época em que foi escrito.


O livro consiste em notas do homem do subsolo, não em notas do próprio Dostoiévski, mas é como se assim o fosse, dada a coincidência entre as notas e as declarações do autor. Tanto que muitos estudiosos afirmam que o livro se trata das próprias posições ideológicas de Dostoiévski, além da sua trágica e triste visão. Entretanto, existe uma diferença entre personagem e autor, que consiste em uma dose extra de sarcasmo encontrada somente no homem do subsolo. São incontáveis os ataques de risos e deboche durante a narrativa.


E é justamente a partir de Memórias do Subsolo que Dostoiévski parece ter encontrado um estilo propício para suas próximas obras (cita-se; Crime e Castigo, O Idiota, Os Demônios e Os Irmãos Karamazov). É através do distanciamento com seus personagens, que o autor se tona capaz de apresentá-los por diferentes ângulos, ao passo que mantêm intacto o seu pensamento.


Quem é o homem do subsolo?

Sou um homem doente... Um homem mau. Um homem desagradável.


O homem do subsolo é a encarnação legítima do pensamento revolucionário que tanto Dostoiévski nos alerta de seus desdobramentos. O homem do subsolo é um ser desprezível, rancoroso, que, em um primeiro momento, assume uma posição heroica, de salvador da humanidade, que julga tudo saber resolver, para no parágrafo seguinte, assumir a sua covardia e sua incapacidade de resolver os próprios dilemas, o que vai desencadear um sofrimento ainda maior, pois suas ações refletem negativamente na vida daquelas pessoas das quais tiveram o azar de encontrá-lo. Se tudo que ele busca é mostrar o quão superior é o seu racionalismo, na prática sua vida não passa da mais miserável possível.


Por ser tão fraco, a ponto não conseguir escapar de uma vida medíocre, o homem do subsolo guarda um tremendo ressentimento para com todos, como no caso dos coitados subordinados quando o narrador era ainda um burocrata e usava sua posição para atormentá-los, ou no de seus ex-colegas de infância que claramente não desejavam a sua presença em um jantar entre verdadeiros amigos. Por último, temos ainda o imbróglio com Liza, a infeliz prostituta da qual o homem do subsolo prometeu ajudá-la a mudar de vida, mas que termina ainda mais humilhada por este. 


O pensamento de Dostoiévski durante o processo de escrita de Memórias do Subsolo:

Em artigos que datam de 1869, sobre suas visitas à Europa, Dostoiévski já alertava sobre o fato de que todo o desenvolvimento da sociedade Russa encontrava-se calcado em ideias importadas das linhas europeias, estando aí a origem do problema suscitado pelo seu distinto personagem que se autoproclama um homem desenvolvido do século XIX, sendo que esse desenvolvimento é o que lhe condiciona ao subsolo. 

Assim, os dois períodos que dividem o livro representam dois estágios da evolução da intelligentsia russa: o sentimental (década de 1840) e o racional e utilitário (década de 1860). No livro, o polemista personagem da primeira parte surgiu do sonhador derrotado da segunda parte. A proposital inversão do tempo durante a narrativa, leva o leitor a descoberta de uma mentalidade drasticamente intransitiva e dividida.

Não à toa, o homem do subsolo conversa com pessoas determinadas; os radicais revolucionários, especificamente os seguidores de Tchernichevski. Ao questionar a verdadeira natureza humana que estava sujeita ao desejo revolucionário de lhe tornar feliz (ideia tal que vai permear o pensamento de Lenin, que confessou ter se tornado radical por meio desta), Dostoiévski responde Tchernichevski tanto ideológica como artisticamente. Os termos pseudocientíficos utilizados pelo narrador, por exemplo, é um claro escárnio à escrita revolucionária. 

Como Dostoiévski temia, o estilo literário de Tchernichevski dominou o pensamento russo, e o que prometia uma sociedade feliz em Que Fazer? (1862), na verdade a levou para miséria e autodestruição. Dostoiévski percebeu tais relações como nenhum outro de seu tempo. Filosoficamente, o autor utiliza o homem do subsolo para refutar seus oponentes, levando a ideia destes ao extremo, tendo como resultado o próprio homem do subsolo.

Quereis, por exemplo, desacostumar uma pessoa dos seus velhos hábitos e corrigir-lhe a vontade, de acordo com as exigências da ciência e do bom senso. Mas como sabeis que o homem não apenas pode, mas deve ser assim transformado? De onde concluís que à vontade humana é tão indispensavelmente necessário corrigir-se? Numa palavra, como sabeis que uma tal correção realmente trará vantagem ao homem? E, se é para dizer tudo, por que estais tão certamente convictos de que não ir contra as vantagens reais, normais, asseguradas pelas conclusões da razão e pela aritmética, é de fato sempre vantajoso para o homem e constitui uma lei para toda a humanidade?

Dostoiévski questiona se o reformador seria capaz de reforma-se a si mesmo, ou será que suas leis para toda a humanidade não lhe alcançariam? A ideia é de que não existem super-homens. Todos estão condenados ao sofrimento, e ainda que restasse possível resolver os problemas materiais através de um plano reformador, em que todas as ações fossem perfeitamente calculadas, previsíveis, haveria ainda um único ponto que os reformadores não deixaram claro se topariam corrigir: a própria existência individual. Assim Dostoiévski elabora:

[...] o homem é um animal criador por excelência, condenado a tender conscientemente para um objetivo e a ocupar-se da arte da engenharia, isto é, abrir para si mesmo um caminho, eterna e incessantemente, para onde quer que seja. Mas talvez precisamente por isto lhe venha às vezes uma vontade de se desviar, justamente por estar condenado a abrir esse caminho, e talvez ainda porque, por mais estúpido que seja um homem direto e de ação, ocorre-lhe às vezes que o caminho vai quase sempre para alguma parte, e que o principal não está em saber para onde se dirige, mas simplesmente em que se dirija, e em que a criança comportada, desprezando a arte da engenharia, não se entregue à ociosidade destruidora, que, como se sabe, é mãe de todos os vícios. O homem gosta de criar e de abrir estradas, isto é indiscutível. Mas por que ama também, até a paixão, a destruição e o caos? 

Em outra passagem, ao atacar o racionalismo aplicado ao “cientificismo social”, procede ainda o autor: 

Gritais (se ainda vos dignais a dirigir-me o grito) que, no caso, ninguém me priva da minha vontade; que todos se afanam a fim de que, por si mesma, por própria iniciativa, minha vontade coincida com os meus interesses normais, com as leis da natureza e com a aritmética.


— Eh, senhores, como é que se pode ter, no caso, sua própria vontade, quando se trata da tabela e da aritmética, quando está em movimento apenas o dois e dois são quatro? Dois e dois são quatro mesmo sem a minha vontade. Acontece porventura uma vontade própria deste tipo?

Memórias do Subsolo

O homem não é uma tecla de piano: uma crítica ao igualitarismo utópico

Ora, estaria o planejador, o grande reformador da sociedade, a salvo desta fatalidade? Saberia ele dirigir a sociedade ao seu destino, do bem comum, da felicidade, sem titubear no caminho, nem por um momento? Está aí genialidade do autor; nua, crua, e drasticamente bela. Todos os pilotos da humanidade, sem exceção, desviaram tanto dos destinos espetaculares, que invariavelmente, acabaram guiando de fato a humanidade para o lugar comum do caos, da destruição, da torpeza. Lugar este, muito distante, senão em sentido completamente oposto ao fantástico destino inicialmente pretendido, como inúmeras vezes tem provado a historia.
 
Uma das melhores qualidades de Dostoiévski é que ele não brinca em serviço quando o assunto é levar ao extremo as mais delicadas questões. É no mais profundo âmago da coisa que autor faz emergir aquelas respostas transcendentais, puramente verdadeiras. O recado deixado pelo gênio da literatura russo aos revolucionários é um exemplo: o homem não é uma tecla de piano!

Numa palavra, pode-se dizer tudo da história universal — tudo quanto possa ocorrer à imaginação mais exaltada. Só não se pode dizer o seguinte: que é sensata. Haveis de engasgar na primeira palavra. E aí está até o que a todo momento se dá: surgem continuamente homens de bons costumes, sensatos, sábios e amantes da espécie humana, que têm justamente como objetivo portar-se, a vida toda, do modo mais moral e sensato, iluminar, por assim dizer, com a sua pessoa, o caminho para o próximo, e precisamente para demonstrar a este que, de fato, se pode viver de modo moral e sensato. E então? É sabido que muitos desses amantes da humanidade, cedo ou tarde, às vezes no fim da existência, traíram-se, dando motivos a  anedotas às vezes do gênero mais indecente até. Pergunto-vos agora: o que se pode esperar do homem, como criatura provida de tão estranhas qualidades? Podeis cobri-lo de todos os bens terrestres, afogá-lo em felicidade, de tal modo que apenas umas bolhazinhas apareçam na superfície desta, como se fosse a superfície da água; dar-lhe tal fartura, do ponto de vista econômico, que ele não tenha mais nada a fazer a não ser dormir, comer pão de ló e cuidar da continuação da história universal — pois mesmo neste caso o homem, unicamente por ingratidão e pasquinada, há de cometer alguma ignomínia. Vai arriscar até o pão de ló e desejar, intencionalmente, o absurdo mais destrutivo, o mais antieconômico, apenas para acrescentar a toda esta sensatez positiva o seu elemento fantástico e destrutivo. Desejará conservar justamente os seus sonhos fantásticos, a sua mais vulgar estupidez, só para confirmar a si mesmo (como se isto fosse absolutamente indispensável) que os homens são sempre homens e não teclas de piano, que as próprias leis da natureza tocam e ameaçam tocar de tal modo que atinjam um ponto em que não se possa desejar nada fora do calendário. Mais ainda: mesmo que ele realmente mostrasse ser uma tecla de piano, mesmo que isto lhe fosse demonstrado, por meio das ciências naturais e da matemática, ainda assim ele não se tornaria razoável e cometeria intencionalmente alguma inconveniência, apenas por ingratidão e justamente para insistir na sua posição. E, no caso de não ter meios para tanto, inventaria a destruição e o caos, inventaria diferentes sofrimentos e, apesar de tudo, insistiria no que é seu! Lançaria a maldição pelo mundo e, visto que somente o homem pode amaldiçoar (é um privilégio seu, a principal das qualidades que o distinguem dos outros animais), provavelmente com a mera maldição alcançaria o que lhe cabe: continuaria convicto de ser um homem e não uma tecla de piano! Se me disserdes que tudo isso também se pode calcular numa tabela, o caos, a treva, a maldição — de modo que a simples possibilidade de um cálculo prévio vai tudo deter, prevalecendo a razão —, vou responder-vos que o homem se tornará louco intencionalmente, para não ter razão e insistir no que é seu! Creio nisto, respondo por isto, pois, segundo parece, toda a obra humana realmente consiste apenas em que o homem, a cada momento, demonstre a si mesmo que é um homem e não uma tecla! 

E é nas últimas linhas de Memórias do Subsolo que, tal qual uma faca precisamente afiada, Dostoiévski cria um rasgo nas pretensões revolucionárias, justamente ao revelar que toda sua narrativa consistiu em levar a cabo aquilo que os próprios revolucionários não têm sequer coragem de fazer pela metade: 

De fato, contar, por exemplo, longas novelas sobre como eu fiz fracassar a minha vida por meio do apodrecimento moral a um canto, da insuficiência do ambiente, desacostumando-me de tudo o que é vivo por meio de um enraivecido rancor no subsolo, por Deus que não é interessante: um romance precisa de herói e, no caso, foram acumulados intencionalmente todos os traços de um anti-herói, e, principalmente, tudo isto dará uma impressão extremamente desagradável, porque todos nós estávamos desacostumados da vida, todos capengamos, uns mais, outros menos. Desacostumamo-nos mesmo a tal ponto que sentimos por vezes certa repulsa pela “vida viva”, e achamos intolerável que alguém a lembre a nós. Chegamos a tal ponto que a “vida viva” autêntica é considerada por nós quase um trabalho, um emprego, e todos concordamos no íntimo que seguir os livros é melhor. E por que nos agitamos às vezes, por que fazemos extravagâncias? O que pedimos? Nós mesmos não o sabemos. Será pior para nós mesmos se forem satisfeitos os nossos extravagantes pedidos. Bem, experimentai, por exemplo, dar-nos mais independência, desamarrai a qualquer de nós as mãos, alargai o nosso círculo de atividade, enfraquecei a tutela e nós... eu vos asseguro, no mesmo instante pediremos que se estenda novamente sobre nós a tutela. Sei que talvez ficareis zangados comigo por causa disto, e gritareis, batendo os pés: “Fale de si mesmo e das suas misérias no subsolo, mas não se atreva a dizer ‘todos nós’”. Mas com licença, meus senhores, eu não me estou justificando com este todos. E, no que se refere a mim, apenas levei até o extremo, em minha vida, aquilo que não ousastes levar até a metade sequer, e ainda tomastes a vossa covardia por sensatez, e assim vos consolastes, enganando-vos a vós mesmos. De modo que eu talvez esteja ainda mais “vivo” que vós. Olhai melhor! Nem mesmo sabemos onde habita agora o que é vivo, o que ele é, como se chama. Deixai-nos sozinhos, sem um livro, e imediatamente ficaremos confusos, vamos perder-nos; não saberemos a quem aderir, a quem nos ater, o que amar e o que odiar, o que respeitar e o que desprezar. Para nós é pesado, até, ser gente, gente com corpo e sangue autênticos, próprios; temos vergonha disso, consideramos tal fato um opróbrio e procuramos ser uns homens gerais que nunca existiram. Somos natimortos, já que não nascemos de pais vivos, e isto nos agrada cada vez mais. Em breve, inventaremos algum modo de nascer de uma ideia. Mas chega; não quero mais escrever “do Subsolo”...

Leitura fortemente recomendada, principalmente aos revolucionários contemporâneos. 


Material Complementar: 


O Homem não é uma tecla de piano – Prof. Jordan Peterson

 


Memórias do Subsolo – Interpretação por Larry Cedar


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Caso tenha gostado, veja também: Crime e Castigo – Fiódor Dostoiévski


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28 de out. de 2020

O Processo – Franz Kafka

O Processo


Entre as leituras de Kafka é unânime o insight que diz respeito à gigantesca amplitude de interpretações que recebe a sua obra, mesmo essa se tratando de um trabalho relativamente enxuto, com pouco mais de 40 escritos conhecidos – número esse que poderia ser ainda menor se não fosse por Max Brot, amigo testamenteiro que não obedeceu ao último desejo do autor de destruir parte do trabalho original.


E, falando em ampla interpretação, em O Processo não poderia ser diferente. Ainda que se tratasse de um romance acabado, seria uma tarefa impensável atribuir uma única visão à trágica narrativa do protagonista Josef K. dada a quantidade de situações em que o autor vai de encontro às mais variadas perspectivas possíveis através de sua forma maestra de apresentar a futilidade dos cenários comuns. 


Talvez resida justamente aí a genialidade de Kafka; futilizar as já fúteis trivialidades das quais todos estamos submetidos cotidianamente. Mas, como diria o ilustre Professor Rodrigo Gurgel “não devemos procurar uma solução definitiva para o Problema Kafka; esse é um problema de contínua análise”. Assim, as reflexões que ora apresento, indubitavelmente carecem de revisões posteriores (até o momento em que organizo tais notas, pude conferir apenas A Metamorfose e O Processo).


A seguir, vejamos então algumas notas acerca de trechos destacados de O Processo.


“Alguém devia ter caluniado Josef K., porque foi preso uma manhã, sem que ele houvesse feito alguma coisa de mal.”


Já nas primeiras linhas, a vida de Josef K., um gerente de banco na casa dos trinta anos, é posta ao avesso ao ser preso numa manhã por dois oficiais tão identificáveis quanto o motivo de sua prisão. O caso fica ainda mais obscuro quando K. não é levado pelos oficiais para uma prisão qualquer; a sua vida se torna uma prisão em si mesma. A partir daí o desenrolar desse processo juntamente com a incapacidade de K. de provar a sua inocência, irão consumir o protagonista até sua autodestruição. Uma vez que cada atividade cotidiana e social estará submetida ao processo, como se todos fizessem parte de um grande tribunal, a vida do acusado perde qualquer propósito pois não passa agora de um terrível labirinto burocrático. 


K. tinha sido avisado por telefone de que no domingo seguinte realizar-se-ia um pequeno interrogatório no âmbito do seu caso. Observaram-lhe que tais interrogatórios se sucederiam regularmente, ou mesmo todas as semanas, pelo menos muito frequentemente.


Em sua primeira defesa diante da suposta audiência de instrução, sem ainda ter dado conta de sua inferioridade perante o processo, K. faz pouco caso do procedimento enfrentado:


A sua pergunta, Senhor Juiz de Instrução, a inquirir se sou pintor de prédios... aliás, o senhor não me perguntou nada, atirou-me esta declaração... é reveladora do conjunto do processo intentado contra mim. Pode objectar que não se trata de modo nenhum de um processo judicial, e tem inteiramente razão, porque não se trata de um processo judicial, salvo se eu lhe reconhecer essa qualidade. Ora, reconheço-a neste instante, por compaixão, por assim dizer.


Em seguida K. até reconhece a imponência do judiciário, mas não sem motivo. Uma critica é elaborada ao sistema inquisidor e seus funcionários:


(...) não resta qualquer dúvida de que por detrás de todos os procedimentos deste tribunal, portanto no meu caso preciso, por detrás da detenção e da presente instrução, dissimula-se uma vasta organização. Uma organização que não só emprega guardas corruptos, inspectores estúpidos e juízes de instrução modestos no melhor dos casos, mas sustenta além disso uma alta magistratura e uma magistratura suprema, com o seu incontornável cortejo de oficiais de diligências, de escrivães, de polícias e de outros auxiliares, talvez mesmo os seus carrascos, a palavra não me mete medo. E qual é o sentido desta vasta organização, senhores? Consiste em fazer prender pessoas inocentes e em intentar contra elas processos judiciais loucos e, na maior parte das vezes, como no meu caso, sem resultado.


Ao perceber inutilidade da defesa até então empregada, K. conclui: 


É então isso! – exclamou K. erguendo os braços ao céu, porque era preciso espaço para esta súbita descoberta. – Vós sois todos funcionários, pelo que vejo, vós sois o bando de indivíduos corruptos que eu vilipendiei; vós acorrestes para me escutar e me espiar, fingistes formar partidos, e um deles aplaudiu-me para me pôr à prova; queríeis saber como enganar os inocentes. Ora bem, não viestes aqui para nada, espero; quer vos tenhais divertido a ver alguém esperar que tomásseis a defesa de um inocente... deixa-me em paz, ou bato-te – lançou K. à cara de um velho trémulo que se havia aproximado de mais –, quer pelo contrário tenhais realmente aprendido alguma coisa. E com isto, desejo-vos boa sorte no exercício do vosso ofício. 


São vários os momentos em que Kafka deixa bem claro que a vida de K. não seria mais a mesma, assim como a de todos aqueles que aguardam o desenrolar de um processo. Uma decisão, um desfecho definitivo é tudo que se espera. Mas de fato, entre despachos e decisões interlocutórias, passam-se dias, meses e anos sem que nada se resolva. A eternidade parece coisa pequena diante do tempo forense. Em um trecho:


A ideia do processo já não o largava. Perguntava muitas vezes a si próprio se não seria bom preparar uma defesa por escrito e apresentá-la no tribunal. Queria fazer nela uma breve história da sua vida e, para cada facto mais significativo, explicar os motivos que haviam determinado os seus actos, em que medida este modo de agir lhe parecia retrospectivamente louvável ou condenável, e por fim que motivos podia invocar numa ou noutra hipótese. As vantagens de semelhante defesa sobre a que o advogado apresentava não ofereciam dúvidas. Para mais, se esse advogado não fosse irrepreensível. K. ignorava aliás que diligências o advogado estava a efectuar; não seria grande coisa, em todo o caso: havia já um mês que não o convocava, e em nenhuma das anteriores conversas K. tivera o sentimento de que este homem pudesse fazer alguma coisa por si.


É importante frisar o fato de que Kafka estudou Direito e trabalhou para uma companhia de seguros e para um instituto onde era responsável pela investigação e avaliação de compensação por danos pessoais para trabalhadores industriais, pois tais experiências em muito influenciaram a escrita de O Processo. Em alguns trechos é perceptível as observações diretas acerca do contato do autor com a burocracia judiciária, do qual ele detestava por lhe consumir tempo que poderia ser dedicado à escrita. Exemplo:


Segue-se que os documentos conservados no tribunal, e sobretudo a peça de acusação, são inacessíveis ao acusado e à sua defesa; por isso é que em geral não se sabe, ou pelo menos exactamente, sobre o que o primeiro requerimento deve tratar, de tal modo que só por efeito do acaso ele pode conter alguma coisa importante para o processo. É só mais tarde que se fica em condições de elaborar requerimentos com uma real pertinência e bem argumentados, quando durante as audições do acusado o pormenor dos artigos de acusação e o seu fundamento aparecem com mais nitidez, ou se deixam adivinhar. Nestas circunstâncias, a defesa encontra-se claramente numa situação muito desvantajosa e difícil. Mas isto é também propositado. Porque, na realidade, a lei não autoriza a defesa, tolera-a simplesmente; e a questão de saber se a alínea em causa deve ser interpretada pelo menos no sentido da tolerância, é ela própria controversa. Por isso não existem, estritamente falando, advogados da defesa que sejam reconhecidos pelo tribunal; os que intervêm perante este tribunal não passam todos, no fundo, de advogados ocultos.


E mais um outro:


De facto, o acusado não tem acesso aos processos do tribunal, e é muito difícil determinar a partir dos interrogatórios sobre que documentos eles assentam, particularmente para um acusado intimidado e distraído por toda a espécie de preocupações. Ora, é aqui que a defesa intervém. Em geral, os advogados não têm o direito de estar presentes nos interrogatórios; por isso, é depois do interrogatório, e se possível ao sair da sala de audiências, que eles devem sondar o acusado sobre o interrogatório, e nesses relatos já muito esbatidos encontrar elementos úteis à defesa. Mas isto não é o essencial, porque não se fica a saber grande coisa desta maneira, mesmo se, aqui como noutro lado qualquer, um homem hábil perceba mais do que os outros. O mais importante, apesar de tudo, são as relações pessoais do advogado: é o que determina principalmente o valor da defesa. Ora, pela sua experiência pessoal, K. tinha agora compreendido que a organização do tribunal, nos escalões inferiores, não é perfeita, inclui funcionários desleais e corruptos, o que provoca de certo modo falhas no sistema fechado do tribunal. E é por aí que se infiltra a maioria dos advogados, é aí que se suborna e que se escuta às portas; até houve, pelo menos nos primeiros tempos, casos de roubos de documentos. É indesmentível que desta forma se obtêm a curto prazo resultados espantosamente favoráveis ao acusado, o que dá a estes pequenos advogados matéria para se pavonearem e atraírem novos clientes; mas para o desenrolar ulterior do processo, isso não significa nada, ou nada de bom. Verdadeiro valor têm só as relações pessoais honestas, e isto com os altos funcionários, ou seja, claro, os altos funcionários dos escalões inferiores. É apenas por seu intermédio que se torna possível influenciar, por certo de uma forma ao princípio imperceptível, mas depois cada vez mais nítida, o desenrolar do processo. Claro que só um pequeno número de advogados o consegue (...).


Sobre o papel do advogado e o exercício da advocacia, Kafka observa:


Aqui percebia-se bem o inconveniente de uma justiça que estipula de início a inquirição secreta. Os funcionários não têm nenhum contacto com a população, estão habilitados para os processos ordinários, de uma importância corrente: um tal processo segue o seu curso quase por si próprio e apenas pede para ser ativado de vez em quando; mas perante os casos muito simples e os casos particularmente muito difíceis, encontram-se muitas vezes desamparados; confinados constantemente, dia e noite, na sua lei, não possuem o sentido das relações humanas, e isso falta-lhes cruelmente nos casos deste género. É então que vão procurar o advogado e pedir-lhe conselho, acompanhados por um oficial de diligências que transporta estes documentos habitualmente muito confidenciais. Nesta janela, puderam ver-se numerosos cavalheiros que ninguém esperaria aí encontrar, lançando à rua um olhar desolado, ao passo que no seu gabinete o advogado estudava as peças para lhes poder dar um bom conselho. Era aliás nestas ocasiões que se podia verificar a seriedade extrema com que estes senhores exercem a sua profissão, e o grande desespero em que os precipitam obstáculos que a sua natureza não lhes permite ultrapassar.


Sobre o interminável andamento processual:


Por certo, há horas sombrias, como todos já experimentaram, em que se julga nada ter realizado, em que se tem a impressão de que só os processos destinados desde o princípio a um desenlace favorável, terminam bem, mesmo sem ajuda exterior, ao passo que os outros perderam apesar de todas as diligências, de todas as fadigas, de todos os pequenos êxitos aparentes com que tanto se regozijavam. Então, nesses momentos, nada mais parece certo de que os processos, por si mesmos bem encaminhados, não foram desviados do seu curso senão por uma intervenção exterior.

Isto também é uma forma de confiança em si, mas é tudo o que então resta. Os advogados são particularmente expostos a este género de crises – porque são simples crises, claro, nada mais – quando de súbito lhes retiram um processo que eles conduziram tão longe e de maneira satisfatória. É sem dúvida o pior que pode suceder a um advogado. Não que seja o acusado que lhe retira o processo, isso nunca acontece, creio eu; um acusado, uma vez que tomou um advogado, deve conservá-lo sempre, seja o que for que suceda. Como poderia, com efeito, ele aguentar-se sozinho, depois de haver recorrido à sua assistência? Isto nunca sucede; mas acontece por vezes que o processo toma uma direcção em que o advogado já não tem o direito de acompanhá-lo. O advogado limita-se a ver ser-lhe retirado o processo, o acusado e tudo o resto; então, mesmo as melhores relações com os funcionários já não podem servir para nada, porque eles próprios não estão informados. O processo acaba por entrar numa fase onde é doravante impossível trazer qualquer ajuda, entre as mãos de tribunais inacessíveis e onde o advogado nem sequer pode contactar com o acusado. Regressamos então um belo dia a casa para achar em cima da secretária a montanha de requerimentos que foram redigidos com muito zelo e formando as mais belas esperanças para este processo: como não podem ser transmitidos neste novo estádio do processo, foram devolvidos; não são mais do que pedaços de papel. Dito isto, o processo não está perdido, de modo nenhum; pelo menos não há nenhuma razão decisiva para supô-lo; simplesmente não se sabe mais nada do processo, e dele não se terá mais nenhuma notícia.


Diante da Lei


Diante da Lei

Na catedral (um dos capítulos finais) K. confessa toda sua resignação com o processo perante o capelão das prisões que ali o aguardava. Para K., apesar de ter tido muito trabalho, nenhum resultado foi obtido até então. E se antes julgava que tudo acabaria bem, agora duvida de si próprio, perdendo as esperanças quanto ao desfecho do processo. O capelão, por sua vez, assim apresenta a parábola Diante da Lei:


Diante da Lei há um porteiro. Um homem do campo chega junto desse porteiro e pede para entrar. Mas o porteiro declara que por agora não pode permitir-lhe a entrada. O homem reflecte, depois pergunta se então poderá entrar mais tarde. «É possível», diz o porteiro, «mas não agora.» Como a porta da Lei estava como sempre aberta, o porteiro afasta-se e o homem debruça-se para olhar para o interior, através da porta. Ao ver isto, o porteiro começa a rir e diz: «Se te atrai assim tanto, experimenta entrar, apesar da minha proibição. Mas cuidado: eu sou poderoso. E não passo do último de todos os porteiros. Porque, de sala para sala, há porteiros, cada um mais poderoso do que o anterior. Mesmo a mim, a simples vista do terceiro já se torna insuportável.» O homem do campo não contava com semelhantes dificuldades; pensa ele que, todavia, a lei deve ser sempre acessível e para todos, mas agora que examina de mais perto o porteiro no seu manto de peles, com o grande nariz pontiagudo, a longa e fina barba negra à tártaro, acaba por decidir que prefere aguardar que lhe dêem licença para entrar. O porteiro dá-lhe uma banqueta e fá-lo sentar ao lado da porta. Fica ali sentado durante dias e anos. Faz numerosas tentativas para que o deixem entrar e aborrece o porteiro com os seus pedidos. O porteiro submete-o por vezes a pequenos interrogatórios, faz-lhe perguntas sobre a sua terra e sobre muitas outras coisas, mas são perguntas que não testemunham qualquer simpatia, como as que fazem os grandes senhores; e a conclusão é sempre a mesma: ainda não pode deixá-lo entrar. O homem, que efectuou inúmeros preparativos para a sua viagem, utiliza tudo, seja qual for o valor, para corromper o porteiro. Este último aceita tudo, mas diz ao mesmo tempo: «Aceito só para que tu não fiques com a impressão de ter negligenciado fosse o que fosse.» Durante estes numerosos anos, o homem observa o porteiro quase sem interrupção. Esquece os outros porteiros, e este, em primeiro lugar, parece-lhe ser o único obstáculo à sua entrada na Lei. Amaldiçoa a fatalidade, em voz alta durante os primeiros anos, depois envelhece e contenta-se em resmungar com os seus botões. Torna-se senil e como, durante todos estes anos passados a estudar o porteiro, também reparou nas pulgas na sua gola de peles, suplica mesmo às pulgas que o ajudem a fazer o porteiro mudar de opinião. Enfim, a vista diminui-lhe, e já não sabe se a obscuridade se espalha real mente em seu redor ou se são apenas os seus olhos que o enganam. Mas distingue na obscuridade uma luz que resplandece sem cessar através da entrada da Lei. Agora já não tem muito mais tempo de vida. Antes da sua morte, tudo o que viveu durante todo este tempo resume-se na sua mente numa pergunta que ainda não formulou ao porteiro. Faz-lhe sinal, porque já não consegue endireitar o corpo hirto. O porteiro é obrigado a inclinar-se para ele, porque as diferenças de altura modificaram-se muito em detrimento do velho: «Que queres tu saber ainda?», pergunta o porteiro, «tu és insaciável.» «Toda a gente se esforça por alcançar a lei», diz o homem, «como é que ninguém, excepto eu, solicitou a entrada durante todos estes anos?» O porteiro apercebe-se de que o fim do homem está próximo, e como é quase surdo, berra-lhe ao ouvido para se fazer ouvir. «Ninguém mais podia obter a autorização de entrar, porque esta entrada se destinava só a ti. Agora, vou-me embora e fecho-a.»


Mesmo não se tratando de uma obra acaba, a parábola oferece um possível desfecho para O Processo. Diante da Lei aparenta carregar consigo uma parte do significado de toda a tragédia enfrentada por K.  O protagonista já não sabe o que fazer para se livrar do processo. Espera provar sua inocência de uma forma desconhecida e já não dispõe de forças para encontrar as devidas respostas. Todas as tentativas foram em vão; o processo consumiu sua vida, assim como a do homem diante da lei. 


Como leitores, somos facilmente levados ao julgamento do quão fútil foram os esforços de K., e ao julgar dessa forma, estamos julgando nossos próprios esforços, pois estes também não escapam das futilidades cotidianas. Fazemos parte do tribunal tanto quanto os personagens de O Processo, e ao julgar as trivialidades de K. também nós condenamos. Eis o brilho da genialidade de Kafka. 


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As notas aqui utilizadas refletem diretamente aquilo que o autor do blog destaca da obra original durante a leitura da mesma, utilizando-se geralmente de citações diretas, indiretas e paráfrases, além de comentários pertinentes que podem ser retirados de outros trabalhos. As notas são criadas com o único intuito de fornecer um rápido acesso a consultas posteriores para estudo sobre o tema. Caso o leitor do blog tenha alguma dúvida ou gostaria de complementar algo, fique à vontade para deixar um comentário logo abaixo ou entre em contato mediante o instagram @waldeirmarques, ou email. 


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20 de out. de 2020

Direito Empresarial – Conceito, Origem e Princípios

Direito Empresarial – Conceito, Origem e Princípios


O Direito Empresarial pode ser conceituado como o conjunto específico de normas (regras e princípios) que disciplinam a atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços (empresa) e aqueles que a exercem profissionalmente (empresários).


Para evitar equívocos acerca da incidência de suas regras,  é preciso, pois, compreender que o direito empresarial não está relacionado a toda a ordem jurídica do mercado, mas apenas à parte dela, que tem a ver com a organização da empresa e com a interação entre empresas. Assim, tem-se que normas que regem as relações de emprego (Direito do Trabalhador) e de consumo (Direito do Consumidor) estão apartadas do Direito Empresarial.


Origem

Embora a atividade econômica exercida através da troca de bens esteja diretamente relacionada com o progresso da civilização, desde os primeiros passos, o mesmo não pode ser dito quanto às normas jurídicas reguladoras dessa atividade que durante a antiguidade eram esparsas e difusas, onde não é possível verificar um corpo específico e orgânico de normas relativas ao comércio.


Um sistema de direito comercial, ou seja, uma série de normas coordenadas a partir de princípios comuns, só começa a aparecer com a civilização comunal italiana, tão excepcionalmente rica de inspirações e impulso de toda ordem. Do meio para o fim da Idade Média, o comércio já atingira um estágio mais avançado, e não era mais uma característica de apenas alguns povos, mas de praticamente todos eles. É nessa época que se costuma apontar o surgimento das raízes do ius mercatorum, ou seja, um regime jurídico específico e autônomo, com características, institutos e princípios próprios, para a disciplina das relações mercantis.


É na civilização das comunas italianas que o direito comercial começa a afirmar-se em contraposição à civilização feudal, mas também distinguindo-se do direito romano comum, que, quase simultaneamente, se constitui e se impõe. O direito comercial aparece, por isso, como um fenômeno histórico, cuja origem é ligada à afirmação de uma civilização burguesa e urbana, pré-capitalista, na qual se desenvolve um novo espírito empreendedor e uma nova organização dos negócios.


Princípios do Direito Empresarial

Dada a autonomia substancial das atividades tipicamente empresariais, o Direito Empresarial também se distingue do Direito Civil por fundamen-tar-se numa principiologia própria, que destaca a imprescindibilidade da empresa como instrumento para o desenvolvimento econômico e social das sociedades contemporâneas, nas quais as bases do capitalismo – livre iniciativa, livre concorrência, propriedade privada e autonomia da vontade – já estão enraizadas e solidificadas como valores inegociáveis para a construção e manutenção de uma sociedade livre.


Esses princípios próprios do direito empresarial estão listados na Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu art. 170, que elenca os princípios gerais da atividade econômica em nosso ordenamento jurídico, merecendo destaque alguns deles.


Princípio da Livre Iniciativa: 

Sendo o princípio fundamental do Direito Empresarial, o princípio da livre iniciativa se desdobra em quatro condições fundamentais para o funcionamento eficiente do modo de produção capitalista: 


I - imprescindibilidade da empresa privada para que a sociedade tenha acesso aos bens e serviços de que necessita para sobreviver; 

II - busca do lucro como principal motivação dos empresários;

III - necessidade jurídica de proteção do investimento privado; 

IV-  reconhecimento da empresa privada como polo gerador de empregos e de riquezas para a sociedade;


Embora a livre iniciativa não esteja elencada nos incisos do art. 170 da CF/1988, que dispõe sobre os princípios gerais da atividade econômica, está expressamente destacada no caput do referido dispositivo constitucional: 


A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios.


O parágrafo único do art. 170 também garante a livre-iniciativa, ao estabelecer que:


É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.


Porém, embora a Constituição assegure, em mais de um dispositivo, a livre-iniciativa, ela própria restringe esse princípio, de modo considerável, ao condicioná-lo ao atendimento de qualificações profissionais (art. 5.o, inciso XIII) ou ao submetê-lo excepcionalmente à necessidade de autorização prévia de órgãos públicos (art. 170, parágrafo único). 


De um ponto de vista liberal/libertário, a tese relativista acerca da livre iniciativa adotada pela CF não prospera pelos seguintes motivos; primeiro, a regulamentação de profissões feita com fundamento numa suposta “proteção da sociedade” peca por retirar do consumidor justamente o direito de decidir se contrata um profissional mais qualificado por um preço mais caro, ou se contrata um profissional menos qualificado por um preço mais barato. Afinal, é exatamente isso o que todos fazem ao contratar profissionais “não regulamentados”. De fato, a regulamentação carteliza o mercado e, como consequência inevitável, restringe a livre-iniciativa, encarecendo preços e estancando a inovação, sempre em benefício da classe regulamentada, mas em claro prejuízo ao público consumidor.


Segundo, o argumento de que certas profissões (medicina, engenharia, advocacia etc.), por envolverem risco, precisam de regulamentação estatal para proteger o consumidor contra maus profissionais, é também é falho, por pressupor que num ambiente de livre mercado seria inexistente qualquer tipo de autorregulação ou certificação profissional. A regulamentação estatal de profissões não assegura a competência de nenhum profissional regulamentado, sobretudo porque os conselhos criados pelo governo para exercer essa função são compostos pelos próprios profissionais, o que gera incentivos ao corporativismo e à criação de barreiras à entrada de concorrentes.

Princípio da função social da empresa

Obviamente, o mencionado art. 170 da Constituição Federal prevê a propriedade privada como um dos princípios gerais da atividade econômica (inciso II). Afinal, sem propriedade privada, especialmente quanto aos chamados bens de produção, não existe mercado. O mesmo dispositivo constitucional, no entanto, também prevê a função social da propriedade como princípio geral da atividade econômica (inciso III).


É dessa combinação de princípios – propriedade privada e função social da propriedade – que decorre um dos mais alardeados princípios do direito empresarial: a função social da empresa.


Quando se fala em função social da empresa faz-se referência à atividade empresarial em si, que decorre do uso dos chamados bens de produção pelos empresários. Como a propriedade (ou o poder de controle) desses bens está sujeita ao cumprimento de uma função social, nos termos do art. 5.o, inciso XXIII, da CF/1988, o exercício da empresa (atividade econômica organizada) também deve cumprir uma função social específica, a qual estará satisfeita quando houver criação de empregos, pagamento de tributos, geração de riqueza, contribuição para o desenvolvimento econômico, social e cultural do entorno, adoção de práticas sustentáveis e respeito aos direitos dos consumidores.


A empresa não deve, segundo os defensores desse princípio, apenas atender os interesses individuais do empresário individual, do titular da EIRELI ou dos sócios da sociedade empresária, mas também os interesses difusos e coletivos de todos aqueles que são afetados pelo exercício dela (trabalhadores, contribuintes, vizinhos, concorrentes, consumidores etc.).


Princípio da livre concorrência

A livre concorrência está expressamente elencada no art. 170 da CF/1988 como princípio geral da atividade econômica (inciso IV), e existem basicamente duas formas pelas quais o Estado se propõe a concretizar esse princípio: coibição das práticas de concorrência desleal, inclusive tipificando-as como crimes, e repressão ao abuso de poder econômico, caracterizando-os como infração contra a ordem econômica.


No primeiro caso, as sanções estão previstas nos arts. 183 e seguintes da Lei 9.279/1996, e o objeto da punição estatal são condutas que atingem um concorrente in concreto (por exemplo: contrafação de marca). No segundo caso, por sua vez, as sanções estão previstas no art. 36 da Lei 12.529/2011, e o objeto da punição estatal são condutas que atingem a concorrência in abstrato, isto é, o próprio ambiente concorrencial (por exemplo: formação de cartel).


Dadas as lições do economista austríaco Israel Kirzner em sua obra Competição e Atividade Empresarial, o processo de mercado é caracterizado pela ação de atores (empreendedores) conscientes de oportunidades de lucro, eles notam discrepâncias de preço (quer entre os preços ofertados e pedidos por compradores e vendedores do mesmo bem, quer entre o preço oferecido por compradores para um produto e pedido por vendedores para os recursos necessários) e adiantam-se para captar a diferença para si mesmos, através de suas compras e vendas empresariais. A competição, nesse processo, consiste em perceber possibilidades de oferecer, a outros participantes do mercado, oportunidades que são mais atraentes que as que estão sendo postas à sua disposição atualmente. Assim, em um ambiente onde não há barreiras quanto a ação dos agentes envolvidos, o processo de mercado é essencialmente competitivo. 


Seguindo a exposição realizada por Kirzner, ao considerar a competitividade do processo de mercado, para assegurar o princípio da livre concorrência (princípio esse já implícito no processo de mercado, por ser essencialmente competitivo), bastaria a garantia da liberdade de entrada, ou seja, a não existência de nenhum tipo de obstáculos ao exercício da atividade empresarial. No Brasil existe uma crença entre a doutrina predominante segunda a qual o estado deve intervir no processo de mercado, principalmente no tocante às praticas de concentração empresarial (fusões, incorporações, etc) e de condutas unilaterais dos próprios agentes economicos (precificação predatória por exemplo), com o fito de evitar um suposto prejuízo à livre concorrência. É daí que surge o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, responsável por uma maior interversão estatal na tentativa de reprimir essas ocorrências, o que por consequência gera uma redução da liberdade no exercício da atividade empresarial. 


Como visto, para que haja livre concorrência, basta apenas que o estada nada faça, deixando o mercado funcionar livremente de fato. Em apertada síntese, não havendo qualquer tipo de barreira, não há o que se falar em concorrência desleal. Se, por exemplo, não existir barreiras para que se possa empreender em uma mesma atividade, a concentração de grupos economicos não terá capacidade de criar monopólios. Enquanto que quem pratica o chamado dumping, ou seja, quem vende um produto por um preço inferior ao de custo para ganhar uma maior fatia de mercado, terá prejuízos na medida em que exerce tal prática, esgotando paulatinamente o seu capital que é sempre escasso, enquanto que aqueles que estão comprando por um preço mais baixo que o de custo podem formar estoques para vendas futuras com lucros, pois não há qualquer impedimento do tipo.


É salutar que a doutrina dominante não possua o domínio sobre o que há de mais moderno na análise econômica da atividade empresarial.


Princípio da preservação da empresa: 

Um dos princípios do direito empresarial mais alardeados pela doutrina especializada nos dias atuais é o princípio da preservação da empresa, o qual vem sendo amplamente difundido, inspirando alterações legislativas recentes, como a Lei 11.101/2005 (Lei de Falência e Recuperação de Empresas), e fundamentando inúmeras decisões judiciais.


O princípio da preservação da empresa também tem sido muito usado pelos tribunais pátrios para fundamentar decisões em matéria de dissolução de sociedades, falência, recuperação judicial etc. Nesses últimos casos, porém, é preciso ter muito cuidado para que a aplicação excessiva e sem critério do princípio não provoque a sua banalização. Muitas vezes atividades empresariais devem mesmo ser encerradas, e nesses casos impedir a falência do empresário ou da sociedade empresária contraria a ordem espontânea do mercado, sobretudo quando a manutenção de tais atividades é conseguida com os famigerados “pacotes de socorro” baixados pelo governo.


O capitalismo é um sistema no qual os empresários auferem lucros privados e sofrem prejuízos privados. Os “pacotes de socorro”, pois, desvirtuam a lógica natural do capitalismo, criando um sistema no qual os empresários bem relacionados auferem lucros privados, mas solidarizam suas perdas com a população. Em suma: o princípio da preservação da empresa não pode, jamais, conferir a certos empresários um “direito de não falir”, algo que infelizmente vem acontecendo com empresários que se dizem “grandes demais para quebrar” (too big to fail). O princípio da preservação da empresa é uma construção importante, mas sua aplicação deve limitar-se às situações em que o próprio mercado, espontaneamente, encontra soluções para a crise de um agente econômico, em bases consensuais. Infelizmente, não é o que temos visto ultimamente.


Fontes: 

1. Direito empresarial: volume único / André Luiz Santa Cruz Ramos. – 10. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020.

2. Competição e atividade empresarial / Israel M. Kirzner; tradução de Ana Maria Sarda. – São Paulo: Instituto Ludwig von Mises. Brasil, 2012.


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As notas aqui utilizadas refletem diretamente aquilo que o autor do blog destaca da obra original durante a leitura da mesma, utilizando-se geralmente de citações diretas, indiretas e paráfrases, além de comentários pertinentes que podem ser retirados de outros trabalhos. As notas são criadas com o único intuito de fornecer um rápido acesso a consultas posteriores para estudo sobre o tema. Caso o leitor do blog tenha alguma dúvida ou gostaria de complementar algo, fique à vontade para deixar um comentário logo abaixo ou entre em contato mediante o instagram @waldeirmarques, ou email


16 de out. de 2020

Como escrever de forma eficiente


Você tem um problema com algo e isso precisa ser resolvido. Irei mostrar qual é o seu problema e como solucioná-lo
.  Isso, de acordo com o Professor Larry McEnerney da Universidade de Chicago, é como deveríamos iniciar qualquer tipo de escrita de forma a torná-la eficaz. 


É indiscutível o fato de que nos mais elevados níveis hierárquicos, principalmente nas profissões mais complexas (advocacia, medicina, academia, economia, negócios, etc), nada é mais necessário e importante do que a escrita. Aqueles que são extremamente capazes de pensar e ao mesmo tempo comunicar, são mais poderosos do que aqueles não o são. E poderosos no bom sentido; de serem capazes de realizar uma variedade de tarefas complexas de forma eficiente, que geram e entregam valor.  


Com isso em mente, vejamos o que o pude retirar das aulas do Professor McEnerney, que podem ser acompanhadas na integra através do Youtube.



1. Escrita eficiente = Valor

O pensamento é inseparável da escrita, e vice-versa, pois ao escrever o autor é obrigado a refletir sobre cada palavra para expressar num todo a sua mensagem. E uma vez que a mente é verbalmente estruturada, pensar e escrever se torna um desafio, pois só será útil o texto que compatibilizar a solução proposta pelo autor (conforme está estruturada em uma cadeia de raciocínio própria daquele que escreve), com o problema que o leitor busca resolver. 


O escritor que pretende puramente transmitir o seu pensamento, ou seus sentimentos, em nada agrega para o leitor que facilmente fica entediado com leituras que não lhe dizem respeito. A ideia, portanto, é resolver o problema do leitor, é mudar a sua visão de mundo, pois o texto eficiente é sempre aquele que entrega uma solução que até então era desconhecida ao receptor.


E ainda que seja comumente dito que para um bom texto é preciso persuasão, organização e clareza, de nada importar utilizar todas essas características e no final não resolver problema algum. É importante ter um texto coeso, organizado e claro? Claro que é! Mas nada disso importa se o texto não entregar o principal; VALOR!


2. O ensino tradicional cria péssimos escritores

Mesmo que a escola, a faculdade e a academia, gerem profissionais aos montes, o que justifica que apenas uma pequena parcela destes profissionais alcance o topo de suas carreiras? Parece haver algo de muito errado no método de ensino, e de fato é exatamente esse o grande problema. 


Durante o processo de aprendizagem, o aluno se tona especialista na entrega de textos para pessoas (professores) que são pagas para cuidar do conhecimento adquirido. Talvez o professor não fique satisfeito com algo, sinalize alguns erros e após as correções o aluno está aprovado. Nesta dinâmica, qual o valor que aluno gerou em seu texto? Zero. A visão de mundo do professor continua a mesma e, independentemente de uma nota máxima e alguns elogios, lembre-se que o professor é pago para ler aquilo.


Já no mundo real, a lógica se inverte. Ninguém sai por aí com um anúncio do tipo "tome aqui uma nota de X e leia esse texto interessante que acabei de criar sobre determinado assunto". É justamente o contrário; é o leitor que demanda e paga por textos capazes de modificar a sua visão de mundo! Quanto maior a eficácia da escrita do profissional, maior o valor entregue, e, por consequência, maior será o seu sucesso. 


Passamos por todo o processo de aprendizagem tratando a escrita de forma contrária ao seu propósito no mundo real/prático. Não à toa, temos aos montes profissionais que penam mesmo nas atividades mais simples de seus ofícios, pelo simples fato de não saberem como entregar valor através da escrita, pois foram condicionados a entrega de resumos e meras opiniões sobre um assunto.


3. Conheça o leitor

Você tem um problema do qual tenho uma solução, portanto me pague X e obtenha meu texto sobre. Todo dia essa proposta é feita por aquele que antes mesmo de escrever já conhece bem o seu leitor, e sabe qual a solução para um determinado problema. Tudo bem se você gosta de escrever para si, como um hobby. Mas para colocar comida na mesa, é preciso entregar valor para o leitor, e isso é feito através do email trocado com o cliente, do relatório entregue ao chefe, da mensagem no whatsapp com o colega de trabalho e tudo o mais que lhe demandar um conjunto de informações em escrito.


O texto de uma peça processual que é endereçada ao juiz, não pode ser o mesmo texto endereçado ao cliente que lhe pagou para resolver um problema. O texto para uma publicação em uma revista científica, não pode ser o mesmo utilizado para apresentar soluções ao público mais leigo. A solução vendida em um livro (instrução/entretenimento), não se confunde com a solução apresentada em um artigo de jornal (informacional). Dessa forma, é necessário compatibilizar a escrita de acordo com a demanda do leitor. Para tanto, conheça o leitor e identifique o problema a ser atacado


4. Causar tensão nos textos é um ótimo exercício

A tensão sempre prende o leitor, pois cria nele uma expectativa de que algo de valor será elaborado no texto. Palavras adversativas, que são utilizadas para interligar duas orações, expressando uma ideia de contraste ou compensação, são ótimas neste sentido. Exemplos:


- Mas

- Apesar

- Contudo

- Entretanto

- No entanto

- Todavia


Essas palavras, entre outras, criam uma instabilidade no leitor, o que lhe faz tomar a leitura com um maior engajamento. O escritor que entrega valor sabe muito bem como utilizar tais palavras, principalmente no início de texto. Mais um exemplo:


Ao verificar as soluções oferecidas no mercado, foi possível constatar que, apesar de uma grande aceitação, essas soluções são ineficientes na maioria dos casos. Apesar destas descobertas, nada impede que um avanço técnico seja obtido. Aqui está o problema.... e aqui está uma forma mais eficaz de resolvê-lo...


Além das conjunções adversativas, existem palavras utilizadas especificamente dentro de um campo de estudo que, apesar de serem facilmente assimiladas com uma ideia geral entre aqueles que atuam na respectiva área, podem parecerem confusas para quem é de fora. E aí voltamos a questão da adequação. Porém, é de suma importância destacar o papel valorativo exercido por estas palavras singulares. 


Um advogado que, por exemplo, informa para o cliente que o andamento do seu processo está assegurado pelo due process of law, nada diz/resolve para o cliente. Valioso seria, portanto, informar que o andamento do processo não será prejudicado, em virtude do devido processo legal, onde a lei determina que os juízes tomem a decisão mais adequada, e ainda que a decisão não seja favorável, restará outras possibilidades de solucionar o problema, pois a lei também estabelece que certos recursos e procedimentos poderão ser adotados.


Exercitar o devido emprego das palavras peculiares à sua profissão, é também uma forma de enriquecer o contato do leitor com o texto, é tonar a escrita eficiente.


Em resumo, escrever de forma eficiente é saber entregar valor; é fazer da escrita uma ferramenta capaz solucionar problemas reais. Guarde isso para sempre!

9 de out. de 2020

A filosofia Bastter de Acumular Patrimônio – Bastter

A filosofia Bastter de Acumular Patrimônio – Bastter

A filosofia de acumular patrimônio defendida pelo Bastter, um dos melhores propagadores do método Buy & Hold no Brasil, consiste basicamente em: trabalhar e estudar, não fazer dívidas, criar uma reserva financeira e realizar aportes mensais em ações de boas empresas. E tudo isso é com o único intuito de obter uma maior tranquilidade financeira e pessoal, ou seja, ter mais paz e menos stress. O enriquecimento virá por tabela.


É por isso que, antes de abordar cada um dos pilares da filosofia Bastter, é fundamental que o pequeno investidor entenda primeiro o que ele está fazendo e onde quer chegar. Acumular patrimônio requer planejamento e comprometimento. Não adianta nada traçar um plano, por mais simples e objetivo que ele possa ser, sem que haja disciplina para colocar em prática o que diz a estratégia.


Porque acumular patrimônio, não tem mistério. Você só precisa gastar menos do que ganha, e o que sobrar; fica por conta dos juros ao longo do tempo. Qualquer um pode seguir essa fórmula. É assim que os indivíduos em uma sociedade economicamente livre acumulam patrimônio desde quando a primeira troca foi feita entre os homens. Funcionou ontem, funciona hoje e vai funcionar amanhã.


Mas se é tão simples assim, por que poucas pessoas conseguem? Porque no papel é simples, difícil é fazer o que deve ser feito. É igual dieta. Todo mundo planeja uma dieta. Para perder peso, é só gastar mais calorias do que se consome que no final vai dar tudo certo. Entretanto, a maioria não emagrece. Planejar é muito simples, colocar a dieta no papel é o mais fácil. Difícil é se alimentar melhor, deixar de comer besteira, fazer exercícios e etc.


Então a única forma do pequeno investidor de se sair bem, é trabalhando para ganhar alguma coisa, e ter disciplina para aplicar o que sobrar depois dos gastos todo mês. Estudar é um fator de suma importância, porque se você aprende a fazer várias coisas de forma competente, a tendência é que as pessoas te paguem mais por isso, e ganhando mais, sobra mais para investir e acumular patrimônio.  


O plano é esse: tem que sobrar todo mês e investir o que sobra para fazer a mágica dos juros compostos funcionar. Claro, vai ter meses que não sobra, porque aconteceu isso e aquilo, mas tudo bem, o importante é que se tenha disciplina para colocar a estratégia dos aportes mensais em prática. 


E só lembrando, o objetivo principal é ter paz e saúde, pois sem isso é impossível acumular qualquer outra coisa. Para ser uma pessoa melhor, no trabalho, nos estudos, nos investimentos, e ser útil para a sociedade de alguma forma, você precisa ter saúde e tranquilidade. A riqueza virá por consequência, e não através de milagres oferecidos por gente picareta. Aliás, quanto antes acabarmos com essa ilusão de que existe fórmula mágica em que uma fortuna aparece na conta bancária do dia para a noite, melhor! Se existe formula mágica, quem a possui não vai sair por aí te oferecendo.


E claro, sempre tem as exceções. Tem milhares de biografias contando como fulano ficou bilionário. Tem também aquela pessoa que ganhou na loteria. Tem a que ganhou uma boa herança, o que se casou com alguém bem de vida e tudo mais. Mas a realidade é dura. Não podemos contar com as exceções, e muito menos com a sorte. Na real, fazemos parte daquela maioria que precisa matar um dragão todo santo dia para colocar comida na mesa. E quanto mais baixo nos encontramos na hierarquia que invariavelmente habitamos, maior é o stress o que gera uma maior propensão a doenças e ao envelhecimento precoce. 


Apenas para resumir: para acumular patrimônio é preciso disciplina para fazer sobrar e aplicar o que sobra todo mês. E o objetivo principal de tudo isso é ter uma melhor qualidade de vida, com mais tranquilidade e saúde.


Dívidas


1. DÍVIDAS

Bom, e como começar de fato? Por experiência própria, todo mundo já deve saber que é impossível construir qualquer coisa em meio às dívidas. 


O problema é que mesmo sabendo disso, somos tentados a fazer novas dívidas, e o pior, comprando coisas que não precisamos, com dinheiro que não possuímos, e tudo isso com o único intuito de agradar pessoas que não dão a mínima.


Claro, sempre tem aquelas dívidas que são feitas por extrema necessidade, quando batemos o carro e precisamos pagar o concerto no cartão, ou quando fazemos um empréstimo para custear o tratamento de uma doença, e por aí vai… já adiantando o que iremos tratar no próximo tópico, é exatamente para isso que serve o acúmulo de patrimônio. Pois é na hora de enfrentar os problemas, que a tranquilidade financeira faz toda a diferença.  


Enfim, o ponto é: independentemente de como acumulamos dívidas, o importante é interromper esse ciclo, pagando as existentes e não fazendo novas, a não ser que você consiga fazer uma única dívida para negociar as existentes a juros mais baixos. Procure renegociar com os credores, pois eles querem receber de qualquer jeito, se for preciso, venda tudo que for desnecessário para quitar o mais rápido possível suas dívidas. Chega de compras parceladas no cartão de crédito, e cheque especial. Quanto menos tempo você levar para quitar as dívidas, mais cedo se torna uma pessoa livre e consciente, financeiramente falando. 


Se não possui quaisquer dívidas, parabéns! Já pode se considerar um ser humano e partir para o próximo passo, que é construir uma reserva financeira, ou reserva de emergência, que como o nome já diz, tem o propósito de te proteger em situações adversas. 


Reserva Financeira


2. RESERVA FINANCEIRA

Sabe seus gastos mensais? Água, luz, internet, telefone, alimentação, combustível, e etc. Digamos que você é pego de surpresa e descobre que irá deixar de receber a sua renda mensal, ou seja, tudo aquilo você ganha por mês, por um motivo qualquer, deixou de existir nesse momento. 


A primeira preocupação será “meu deus, como vou fazer para honrar meus compromissos?”. Você perdeu o emprego e no lugar de se preocupar em encontrar uma nova oportunidade, ou estudar para aprender algo novo, ou até mesmo começar o seu próprio negócio, você irá gastar tempo e energia pensando nas contas. Ou pior ainda, se você ou um familiar adoece, e ao invés de procurar o melhor tratamento, já imaginou desperdiçar tempo e energia com contas? 


O pequeno investidor não pode ser pego de surpresa. Digamos que você tem o equivalente a 2-3 salários acumulados, não faz o menor sentido investir essa quantia em qualquer coisa que seja. Se você resolve investir esse dinheiro é muito provável que não irá dispor dele de imediato em uma situação de emergência, além disso vai acabar perdendo alguma coisa pra sair do investimento pagando taxa e intermediário, isso se conseguir sair...


Repito, o pequeno investidor, não pode ser pego de surpresa. Ele é pequeno! Primeiro, que ele não pode arriscar todo o dinheiro que sobra no fim do mês; esse é justamente todo o patrimônio que possui. E segundo que, se surgir algum imprevisto, uma reserva de emergência será de extrema importância.


Portanto, a regra é de ouro da reserva financeira é ter em poupança ou até mesmo em conta corrente uma quantia que seja o suficiente para cobrir seus gastos mensais por um período de no mínimo 6 meses, pois dessa forma temos uma margem de tempo e dinheiro para superar alguma adversidade com certa tranquilidade. 


Não é pra olhar a rentabilidade da poupança! Sempre vai ter alguém que se acha o fera dos investimentos para dizer “ah mas a poupança perde para a inflação, é melhor investir nisso e naquilo”. Mas aqui o importante não é a rentabilidade, mas sim a disponibilidade. Quando você precisar da reserva financeira é pra ir no caixa eletrônico e sacar, ou entra no app do banco para fazer a TED na hora. Reserva de emergência já diz tudo, é pra emergência!


Se você colocar sua reserva financeira em renda fixa, por exemplo, em títulos do tesouro que é o ativo mais popular nesse caso, se acontecer algo e você precisar da grana, vai ter que pagar mais taxas e impostos por sair antes do vencimento do título, e ainda vai precisar aguardar 2-3 dias úteis para dispor do dinheiro na conta corrente, isso se o tesouro direto não estiver suspenso. Se for em renda variável, pior ainda! Fora a corretagem, vai ser preciso vender os ativos a preço de mercado. No final das contas, o fera neném dos investimentos, que não faz reserva de emergência, termina é mais pobre, porque ficou girando patrimônio toda hora, enriquecendo intermediário e o governo. 


Por isso, o pequeno investidor deve começar pela reserva financeira. Parte daquilo que sobra todo mês deve ficar na sua conta corrente, ou poupança. E quando precisar, é simples, você vai lá saca e resolve o problema. Reserva de emergência significa isso: menos stress, o que por tabela rende mais paz e saúde. 

 

Agora que você já entendeu, que não pode ter dívidas e precisa de uma reserva de emergência que venha ao seu socorro quando mais precisar,  vejamos então a questão dos aportes mensais, o terceiro e último passo.


Fachada da sede da B3 na capital paulista.


3. APORTES MENSAIS – NO QUE INVESTIR

Depois que a reserva financeira chegar ao valor ideal, aquele dinheiro que sobra todo mês precisa ser aplicado de forma correta caso queira construir um patrimônio de forma sadia e sem grandes preocupações. 


Há várias possibilidades de aplicações, entretanto a ordem mais simplificada para diversificar seus aportes consiste em: 1) aportar em renda fixa, através da compra de títulos do tesouro direto, e; 2) depois que você estiver satisfeito com o patrimônio aplicado em renda fixa, aí pode destinar os novos aportes em renda variável, através da compra de ações de boas empresas, e bons fundos imobiliários;


Depois de um certo tempo, é possível diversificar ainda mais, comprando moedas, ouro e até mesmo imóveis, mas isso tudo é quando o pequeno investidor já não é tão pequeno assim. Então de início, basta aplicar em renda fixa através dos títulos e em renda variável com ações de boas empresas, além dos fundos imobiliários.


Por que começar pela renda fixa?

É simples, o patrimônio alocado em renda fixa vai servir como uma espécie de colchão para a nossa burrice/loucura, porque não adianta nada entrar de cara na bolsa, sair comprando ações de toda espécie para quando na primeira queda, já bater o desespero e vender tudo na baixa. Porque é isso que a grande maioria faz na bolsa. Compra na alta e vende na baixa. E o pior, é que quem erra geralmente não assume a própria burrice e culpa Deus e o mundo, fala que a bolsa é casino, que o mercado é manipulado, que o capitalismo é perverso, dentre outras desculpas esfarrapadas que mal servem para esconder a realidade. Aí o perdedor vai atrás de outro rolo, outra ilusão, de ficar rico, de não sei o que lá do 0 ao milhão, da nova pirâmide que dessa vez não é pirâmide, e perde outra vez, e de novo e de novo, sempre girando patrimônio, enriquecendo intermediário, o governo e os picaretas.


Por isso, quando estiver ok com a sua reserva financeira, comece a fazer seus aportes em renda fixa, e continue com os aportes em renda fixa até chegar o momento em que se sentir tranquilo o suficiente para dizer: pronto, o que eu aportar a partir de agora é dinheiro que posso perder, é dinheiro do tipo que se a bolsa despencar pela metade amanhã, eu não vou me preocupar, não vou entrar em pânico e nem sair vendendo nada na baixa. 


Porque a bolsa, mesmo sendo o melhor investimento ao longo do tempo, quando ela desaba, por qualquer motivo que seja, sempre é o fim do mundo. Se pegarmos as piores crises mundiais só nos últimos 20 anos, com a bolha das empresas de internet, a crise do subprime em 2008, e a mais recente agora com a pandemia do Covid, quando a bolsas despencaram de forma vertiginosa, saiu gente a rodo do mercado financeiro justamente no fundo. E se tiver outra crise amanhã, o cenário é o mesmo. Gente iludida que coloca dinheiro que não pode perder na bolsa; sai na primeira queda. 


É importante que isso fique bem claro, porque se trata de algo difícil até para quem já tem um bom tempo sendo sócio de boas empresas que é a forma mais adequada de acumular patrimônio na bolsa, e que iremos discutir logo mais. Nas primeiras vezes é aquela história, o frio na barriga se espalha pelo corpo todo, você se pergunta o que tá fazendo, começar a duvidar de si mesmo e aí bate aquela vontade de vender tudo. 


Mas se você tem aplicações em renda fixa, fica mais fácil superar esses momentos. A sensação de pânico já não é tão sufocante a cada nova queda e com o tempo você começa até ficar avesso à ideia de fim dos tempos que os jornais martelam em toda nova crise que surgir. 


Não, o mundo não vai acabar, e aconteça o que acontecer, você tem uma boa reserva de emergência, e isso já é o suficiente para ajudar a superar as adversidades com mais tranquilidade. Com um reserva de emergência, e um boa parte do seu patrimônio em renda fixa, você já sai na frente de muita gente durante esses momentos e isso faz de você uma pessoa mais consciente, com capacidade de agir e ajudar a família e todos aqueles que estiverem ao seu alcance. 


Bom, e em quais títulos aportar?

Simples: Tesouro IPCA Principal para o maior prazo disponível a venda.

Com esse título seu dinheiro não perde poder de compra para inflação, porque o rendimento nominal dele é justamente a soma da inflação + algum trocado, que será o seu rendimento real.


Aí sempre aparece o primo rico que questiona sobre a escolha do prazo ser muito longo, e aí começa o papinho de “e se eu precisar do dinheiro, e tal”. E pior ainda é a besteira de querer adequar o vencimento para a suposta data da aposentadoria que é uma loucura total, pois a última coisa você gostaria, se realmente existisse o dia da aposentadoria, era de um tesouro direto vencer. Vai fazer o quê? Pegar todo o dinheiro e gastar de uma vez? Deixar ele em casa?


Enfim, todo dinheiro investido é seu e quanto maior o prazo dos seus investimentos melhor, pois pagará menos taxas e impostos ou ao menos irá demorar mais a pagar os impostos que é uma vantagem, pois está capitalizando juros sobre aquele valor até pagar. Quanto mais tempo ficar nos investimentos mais juros compostos, portanto escolha sempre o IPCA principal de maior prazo e pronto. Se algum dia precisar do dinheiro ele é seu. Óbvio que o ideal é levar os títulos até o vencimento, porque ao realizar o resgate antecipado do tesouro pode acontecer de haver perdas, mas se tiver Reserva de Emergência e diversificar em outros investimentos, isso será algo bem difícil de acontecer.

 

Se tudo estiver claro até aqui, o problema que vem agora é o seguinte:

Você já possui uma reserva de emergência, está satisfeito com a patrimônio acumulado em renda fixa, e agora? como faz para sobreviver na bolsa de valores, quais ações comprar?


primeiro, se você já sabe o que é um trade, esqueça, ou pare a leitura por aqui, ela não lhe serve. Se você ainda não conhece o trade, melhor ainda… porque a única coisa que precisar aprender sobre trade é o seguinte: a finalidade do trade é ter algum lucro ao comprar uma ação na baixa e vendê-la na alta. O problema é que não foi dado ao ser humano o poder de prever o futuro, então o que acontece na realidade consta de forma resumida nessa imagem:

A grande maioria dos traders perdem dinheiro
Ah mas fulano vende um curso de day-trade que é ganho garantido... Se ouvir a palavra garantido, confere se sua carteira ainda está no bolso e corre, porque certamente é algum picareta querendo te sacanear. Se ainda não estiver satisfeito, em um estudo realizado por professores da FGV sobre a o day trade, a conclusão foi a seguinte:


De que não faz sentido, ao menos econômico, tentar viver de day-trading. Das 19.696 pessoas que começaram a fazer day-trade em mini índice entre 2013 e 2015; dessas, 18.138 (92,1%) desistiram, umas mais cedo, outras mais tarde; das 1.558 pessoas que persistiram por mais de 300 pregões, tentando de fato viver de day-trading, 91% tiveram prejuízo e apenas 13 pessoas obtiveram lucro médio diário acima de R$ 300,00. Os dados também mostram que o desempenho do day-trader não melhora à medida que ele persiste na atividade (na realidade, piora).


E ponto final.


Então como é que o pequeno investidor sobrevive na bolsa?

Comprando ações para se tornar sócio de boas empresas. Porque no longo prazo, o preço da ação acompanha os lucros da empresa. Então se você se tornar sócio de boas empresas, a tendência é que seu patrimônio aumente.


E se a empresa não for boa? Aí vem outro detalhe, que é a diversificação. NÃO é para entrar na bolsa para ser sócio de UMA empresa, mas SIM para ser sócio de VÁRIAS. Porque se colocar tudo em única empresa, se o valor dela cair pela metade, isso representa 50% do seu patrimônio em renda variável. Agora se você tem uma carteira com 10 ações por exemplo, sendo que fez os aportes direitinho e em cada uma delas possui 10% do seu patrimônio em renda variável, se algo de errado acontecer com alguma delas, e o valor despenca pela metade, a perca de patrimônio é de apenas 5%. Daí a importância de diversificar, não só em ações, mas também em tipos de investimentos.


Ah mas o meus aportes mensais não permitem que eu saia comprando ações de 10 empresas diferentes todo mês... Pra quem está começando, basta ir comprando as ações que ainda não possui, e quando tiver aportes em todas as ações das quais você estudou e pretende ser sócio, todo mês você vai lá e aporta na que possuir uma menor fatia do seu patrimônio. Dessa forma você mata dois coelhos de uma cacetada só, pois evita comprar as ações que subiram muito de preço, pois a valorização delas faz com que aumentem as porcentagens do que representam no acumulado, ao mesmo tempo que equilibra a diversificação do patrimônio na carteira de ações.


Ok, já entendi que devo ser sócio de boas empresas, e diversificar meus aportes para acumular patrimônio através de cada uma delas. Mas como saber se uma empresa é boa?


Esqueça as indicações de analistas, de corretoras e de jornais especializados. Todo mundo aí vai está fazendo um trabalho para alcançar objetivos distintos dos seus. E ninguém melhor para cuidar do seu dinheiro, do que você mesmo. Então, para saber se uma empresa é boa, é a mesma coisa de saber como anda a situação financeira em sua casa, por exemplo. O importante é verificar se:  


a) a empresa tem lucros consistentes; 

Todo balanço anual até agora reportou lucros, as vezes ele cresce ou diminui um pouco, ou mais cresce do que diminui, mas de uma forma ou de outra a empresa dá lucro de forma consistente. E esse é um dos dados mais importantes para quem quer ser sócio de boas empresas, porque renda variável, já implica variações para baixo e para cima, aí muitas vezes acontece de uma empresa ter lucros consistentes e o preço da ação oscilar de forma negativa para analistas e a mídia noticiar que a empresa caiu tantos porcentos, que ficou desvalorizada e isso e aquilo, mas no final, se a empresa for boa, tanto faz se caiu 2, 5, 10% no dia, pois o que importa é se tem lucros consistentes, porque no longo prazo a tendência é que o preço acompanhe o lucro.


b) a empresa não tem rolo aparente;

A empresa é Novo Mercado, ou seja, possui boa governança e transparência e só emite ações com direito de voto, que são as chamadas ações ordinárias (ON). A empresa pode até não ser Novo Mercado, mas é preciso ter ações ordinárias ON, porque empresas que só possuem PN você não precisa nem perder tempo com elas. Sócio é quem tem ações ordinárias, é quando o código da ação termina com o 3 (exemplo: WEGE3, LREN3). Ação preferencial é rolo, pode esquecer.


c) a empresa não tem dívidas, e se tem é dívida controlada para gerar fluxo de caixa ou fazer alguma aquisição;

dívida controlada, é quando a dívida da empresa não vale nada quando comparada com o seu patrimônio líquido. Imagine a pessoa que possui um casa, um carro, tudo quitado, tudo no seu nome, e aí como todo filho de Deus ela vai para o trabalho e para isso ela sempre abastece o seu carro utilizando o cartão de credito porque ela acha mais cômodo, aí quando chega no fim do mês essa é a única dívida que ela possui. Será que para pagar essa dívida vai ser preciso vender o carro? a casa? Claro que não, e isso se chama dívida controlada. Agora, se o total da dívida da empresa for equivalente a boa parte do seu patrimônio, aí é fria, ou tem rolo. Mesmo quando empresas se endividam para fazer novas aquisições (compra de outras empresas ou ampliação estrutural/logística), a dívida resultante não pode ameaçar a sua liquidez patrimonial. 


E quantas empresas? 

De 12 a 16 empresas já é o suficiente para montar uma carteira de ações bem diversificada. Mesmo que ainda não tenha comprado nenhuma ação, o ideal é que sua carteira esteja montada, que você tenha em mente aquelas empresas das quais pretende se tornar sócio com base nos critérios que acabamos de abordar. Quando entrar na bolsa, entre devagar mesmo, compre uma ação, no máximo duas por mês, e quando possuir patrimônio em todas as ações, sempre destine os novos aportes para aquelas que estão para trás. Não precisa nem de planilha, porque basta logar na corretora para saber o quanto você possui em cada ação.


RESUMO:

1. O objetivo de quem deseja acumular patrimônio sendo um pequeno investidor, é ter mais paz, tranquilidade e saúde. A riqueza virá por consequência;


2. Ou dívidas ou acúmulo de patrimônio, as duas coisas não dá.


3. Tenha uma reserva financeira que seja o suficiente para cobrir seus gastos mensais por um período mínimo de 6 meses. É de suma importância que a reserva de emergência esteja em uma conta de imediata disponibilidade.


4. Faça aportes mensais para acumular patrimônio em renda fixa e variável. Defina o quanto pode ter acumulado em cada tipo de investimento. Diversifique seus aportes em renda variável, através de uma carteira com pelo menos meia dúzia de ações de boas empresas distribuídas em diferentes setores da economia.


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